Maurício Adinolfi Textos



Texto para a exposição Mangue



Nas pinturas de Maurício Adinolfi, o brilho metálico da tinta prata impede que vejamos plenamente a representação. Embora os relevos presentes na superfície da tela pareçam fundidos e não construídos pelo gesto do pintor, o ritmo das pinceladas define as formas, criando uma forte sensação táctil. É possível perceber na fatura meticulosa, a origem e orientação de cada movimento. Por meio desse jogo entre fosco e brilhante, Adinolfi, sem variações tonais, no interior de uma superfície monocromática, produz luz e sombra.

A visão dificultada da obra obriga o observador a pequenos deslocamentos, num balanço semelhante ao de um pescador em uma canoa, sempre se reequilibrando. É desse ponto de vista que vemos as paisagens, desviando das sombras e procurando as luzes. Mas a partir de alguns ângulos, as áreas foscas escondem porções enormes de figuração e as áreas brilhantes apresentam as imagens apenas por aspectos gráficos: incisões e relevos. Se na tradição da pintura, luz e sombra, ao dinamizarem os planos da representação, são responsáveis por criar um espaço virtual, entre o fosco e o brilhante existe um dinamismo de outra ordem. O seu encontro parcial com a representação não permite ver completamente a paisagem, deixando sempre alguma coisa velada. Se no jogo entre o plano e a virtualidade, por um lado, os intervalos entre as formas assumem o lugar do profundo, por outro o brilho metálico rompe a representação e vemos a superfície como relevo.

O brilho prateado que toma conta de todas as composições nos coloca dentro do mangue, podemos ver parcialmente os gravatás, rizophoras, antúrios, cara de cavalo etc. Faz lembrar aquelas horas do amanhecer ou entardecer, quando a luz do sol muito inclinada nos ofusca a visão tornando a paisagem metalizada. Uma insolação que elimina os contrastes e desbota as cores, semelhante a um muro caiado no alto verão.

Segundo Adinolfi, a série Mangue “guarda relação com as intervenções realizadas em regiões litorâneas de rio e mar. Reúnem um estudo da flora nativa originária dos mangues, mata atlântica e serras tropicais. Tratam das transformações e destruições devido à ação humana”. Existe alguma analogia entre os procedimentos adotados na realização das pinturas e os resíduos que degradam o meio ambiente. Nas pinturas de Adinolfi, as veladuras, as lacas, os vernizes, o pigmento prata sobre óleo, também provocam um sufocamento, seja da cor por baixo das camadas de prata, seja da própria paisagem empalidecida.

José Spaniol.
Novembro de 2014.